Aos primeiros raios do sol, pisar, com os
pés descalços, na grama cheinha de orvalho congelado é uma das lembranças dos
tempos em que a geada era a paisagem das nossas manhãs de toda a estação fria
que nos primeiros dias de abril já se iniciava. Longa estação gelada que se
estendia até para depois de setembro.
Umidade
concentrada na parte interna das vidraças em puro gelo era transformada. E
através do vidro transparente da janela e através do gelo transparente aderido
à janela via-se a imensidão do branco pelos campos na distância espalhado.
E
as águas que nas bacias ficavam para se lavar o rosto no amanhecer, em pedras
de gelo transformadas ficavam.
Faces
rubras pelo caminhar de encontro ao gelado vento.
Grossos
gorros, grossas mantas, grossos casacos, grossas meias, tudo tecido em lã pelas
hábeis mãos de todas as mães.
Caminhos
congelados e escorregadios vencidos com vagar. Mas sempre vencidos.
No
caminho do trem entre a nossa vila e a cidade o gelo pendurado nas escarpas
sombreadas pareciam grutas com suas estalactites e suas estalagmites. Eram
cascatas congeladas que do alto dependuradas permaneciam dia após dia. Cascatas
de gelo pendentes nas pedras por dias e dias enquanto durasse o inclemente
frio.
Muito
tempo depois o caminho da vila para a cidade era outro.
Eu
passava pelos campos congelados da Charqueada, no meu quotidiano caminhar nas
madrugadas, em rumo do hospital. E ficava a encantar-me com a brancura toda que
refletia uma lua cheia a se despedir em seu poente no canto oeste do mundo,
enquanto o sol começava a surgir do outro lado.
Outro
espetáculo inolvidável foi o de outro caminho. O caminho em outra madrugada
enluarada rumo ao aeroporto na distante Curitiba. Aquela brancura infinita que
se via sob a luz do luar desde aqui até lá.
Ver
o gelo na grama cintilando como estrelas, em toda aquela imensidão, com os
primeiros raios do sol neles a incidir, enquanto por meu voo eu aguardava, é algo que na memória gravado fica pelos tempos sem fim.
E
no jardim de minha mãe o colorido dos amores-perfeitos recobertos por fina
camada de congelado orvalho no amanhecer, deslumbrava a minha visão quando, ao
incidir sobre eles os raios do sol da manhã, retornavam ao seu colorido sem
par, sorrindo para o mundo, sorrindo para nós, como a dizer que do frio sempre
se renasce feliz.
Lindo texto!
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