Vou falar de novo sobre coisas de minha terra. Mas já dizia um poeta maior: “Todos cantam sua terra, também vou cantar a minha”. Não cantarei. Contarei.
Era em lindo estilo Enxaimel aquela que foi a pioneira escola de Marcílio Dias. No mesmo local onde hoje se encontra a Escola “Manoel da Silva Quadros”. Mas não ficava à margem da estrada, não. Ficava bem ao fundo, bem no alto, bem longe da poeira e do barulho da rodovia Bernardo Olsen, onde se chegava desfilando sob uma alameda de cedros.
Cedro era o nome das frondosas árvores que lá viviam, altaneiras, apontando para o céu. Um dia me disseram que o nome correto era cipreste. Mas para mim continua sendo cedro. Assim as conhecemos e assim continuamos a chamá-las. Cedros e cedrinhos, as belas árvores que enfeitam os nossos jardins e as nossas praças.
E lá ao fundo a escola. A Escola São Bernardo. Com uma sala de aula que tinha até uma estufa de ferro ao centro com longa chaminé que se exibia telhado acima e afora apontando para o céu e trazia o doce aquecer dos dias de inverno. Com um lindo avarandado de onde se descortinava uma paisagem maravilhosa, a perder de vista. Os rios Canoinhas e Negro, os campos, a ferrovia e mais a feia fumaça da enorme serraria que era a Lumber, em Três Barras. E em plano perpendicular, anexa à escola, a residência do professor, formando um só conjunto.
Uma escola alemã para a Colônia São Bernardo. Era a Escola. Nela estudaram minhas irmãs e meus irmãos mais velhos. E uma plêiade de jovens cujos pais, naquela época, tiveram a lucidez necessária para fazer com que seus filhos não só aprendessem as primeiras letras, mas que tivessem uma visão de cultura, uma visão de futuro. Ensinava-se a língua alemã. A cultura alemã. As músicas e as canções alemãs.
E havia a biblioteca. Com literatura alemã e portuguesa também. Muitos livros infantis. A semente que formou ávidos leitores e a biblioteca que permanece. Um legado de amor.
Segundo contavam minhas irmãs, foram dois os professores que por lá passaram e tudo ensinavam. O professor João Moeller, que penso tenha sido o primeiro e depois o professor Johanes Rothert. Lembro do professor Rothert.
Não estudei na Escola São Bernardo. Em algum dia entre 1937 ou 1938 foi implantada a Escola Pública Estadual. Ficava mais embaixo, em outra rua. Era de madeira, construída ao estilo Marcílio Dias, como eu costumava chamar. Tábuas colocadas transversalmente, encaixadas umas às outras. Uma sala de aula com uma pequena varanda à frente.
A primeira professora da Escola Pública foi Sylvia Soares de Carvalho (depois Schossland). Morava em nossa casa. E eu ia com ela para as aulas. Não me perguntem como foi esta história porque não lembro. Mas eu ia. Não havia Jardim de Infância, nem Maternal ou nada parecido. Mas eu ia para a aula. Depois foi a vez de Dona Jusselina de Paula e Silva (depois Nunes). Que também ficou morando lá em casa.
Assim como na Escola Alemã, na Escola Pública era uma sala só e um só professor para todas as classes. Mas em um dia de um ano que não sei qual foi não havia mais a Escola Alemã. Diziam que foi por causa da guerra. Da Segunda Grande Guerra Mundial.
O que eu sei é de um tempo em que as coisas já estão mais nítidas na memória. Que em 1942 havia a escolinha onde a professora Jusselina dava aula para o primeiro ano. E no prédio de enxaimel onde tinha sido a Escola Alemã funcionava também a escola pública elementar. Nele tinham aulas os alunos do segundo e do terceiro ano e a professora era minha irmã Aline.
Lembro-me também de um triste dia em que, ao voltarmos da escola, encontramos a irmã de uma colega que subia a rua ao nosso encontro e, chorando contava que o pai dela e mais outros senhores tinham sido levados para a cadeia porque estavam falando em alemão.
À tarde eu sempre ia brincar e estudar na casa de outra colega onde, no verão, se tomava um chá de hortelã muito gostoso. E todos também estavam chorando e me mostraram as paredes da cozinha chamuscadas e enegrecidas pelo fogo no local onde antes havia lindos panos de parede com bordados de casas e gansos e flores e frases escritas em alemão.
Em casa meus nonos me explicaram depois que eles também não poderiam mais falar em italiano.E, então, entendi que o mundo não era feito de irmãos.
Quadro pintado a partir de uma fotografia da antiga escola em estilo enxaimel. |
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